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| Projeto multibilionário em Nevis gera temor de autonomia paralela e tensão política local. Foto: Divulgação/Destiny SSZ/via R7 |
O projeto Destiny, liderado pelo bilionário belga e investidor em bitcoin Olivier Janssens, está transformando a ilha de Nevis, no Caribe, no centro de um dos debates mais complexos sobre soberania e governança privada da atualidade. A iniciativa prevê a criação de uma comunidade libertária de alto luxo na costa sul da ilha, operando sob um sistema jurídico próprio e amparada por uma legislação inédita aprovada em meados de 2025. Conhecida como Lei das Zonas Especiais de Sustentabilidade, a medida concede aos desenvolvedores uma autonomia sem precedentes, permitindo que grandes empreendimentos estabeleçam seus próprios mecanismos de resolução de disputas, o que na prática abre caminho para a implementação de tribunais privados dentro do território nacional.
Gerido pela empresa South Nevis Ltd, o projeto conta com o prestígio do escritório americano Skidmore, Owings & Merrill, responsável pelo Burj Khalifa, para projetar um complexo que inclui vilas residenciais, hospitais de última geração e centros médicos. Janssens, que possui cidadania nevisiana, justifica a necessidade de um sistema judiciário paralelo criticando a atual ineficiência das instituições locais, argumentando que a reprodução do modelo estatal tornaria o investimento pouco atrativo para a elite global. Embora ele garanta que a comunidade permanecerá sob a jurisdição final do governo e aberta aos moradores locais, sua descrição de Nevis como uma "nação anfitriã" para ideais libertários reforça a percepção de que o projeto busca criar um enclave de autogestão.
O escopo do empreendimento, cujos investimentos podem alcançar vários bilhões de dólares, gera profunda divisão na ilha. De um lado, há o impacto econômico direto em um país com PIB de apenas US$ 1,1 bilhão, incluindo a promessa de Janssens de injetar US$ 50 milhões em infraestrutura local. De outro, políticos da oposição e residentes temem a formação de um "Estado dentro do Estado". O deputado Kelvin Daly é um dos críticos mais vocais, afirmando que a legislação foi aprovada sem consulta popular e que o termo "sustentável" mascara a concessão de privilégios excessivos a investidores privados, colocando em risco recursos essenciais como água e energia elétrica, que já são escassos na região.
A controvérsia ganha contornos éticos com o envolvimento de Sharon Brantley, esposa do primeiro-ministro Mark Brantley, como a corretora imobiliária responsável pela aquisição das terras. A ausência de comentários oficiais do gabinete do governo sobre possíveis conflitos de interesse alimenta a desconfiança da população e de observadores internacionais. Enquanto o Destiny avança como uma proposta de utopia tecnológica e liberdade individual para seus futuros moradores, para os 13 mil habitantes de Nevis ele representa um desafio existencial que testa os limites entre o desenvolvimento econômico agressivo e a preservação da soberania nacional no coração do Caribe.
