![]() |
Charme e romantismo em serie de época tem encantado a geração Z. Foto: Reprodução/Alamy/via BBC Brasil |
É comum associarmos cortejos à moda antiga e costumes da alta sociedade a séries como "Bridgerton", "Os Bucaneiros" e "A Idade Dourada". No entanto, o charme do cavalheirismo retratado nessas produções tem impulsionado um fenômeno nas redes sociais, especialmente entre a Geração Z: o "tratamento de princesa".
O que é o "tratamento de princesa"?
Essa tendência se refere a gestos românticos, inspirados em contos de fadas, realizados por parceiros de mulheres. Isso inclui, mas não se limita a, servir café na cama, dar flores semanalmente, pagar por manicures e abrir portas. Em plataformas como o Instagram e TikTok, o "tratamento de princesa" é frequentemente contrastado com o "mínimo necessário", ou seja, as expectativas básicas em um relacionamento, como boa comunicação ou lembrar datas especiais. A natureza "clicável" desses atos de afeto, transformados em exibições públicas, gerou quase 130 mil publicações com a hashtag #princesstreatment no Instagram.
Uma figura central na popularização dessa tendência é Courtney Palmer, influenciadora de Utah que se autodenomina "princesa dona de casa". Em um vídeo viral no TikTok, com 7,6 milhões de visualizações, ela descreve suas controversas expectativas em relação ao cônjuge: "Em um restaurante com meu marido, eu não falo com a recepcionista, não abro a porta nem peço a minha comida." Críticos, como Emma Beddington do jornal britânico The Guardian, classificaram esse comportamento como "emético" e "perturbador", chegando a compará-lo mais ao de uma prisioneira do que ao de uma princesa. No entanto, a tendência continua a ganhar força, principalmente nos EUA.
Por que o "tratamento de princesa" está em alta?
Para Myka Meier, influenciadora de etiqueta com mais de 650 mil seguidores no Instagram, o sucesso do "tratamento de princesa" se deve ao desejo por um romance "à moda antiga" em uma era de relacionamentos por vezes "transacionais e confusos". Ela argumenta que a tendência não é sobre materialismo, mas sim sobre atenção emocional, requinte, respeito e intencionalidade.
O fascínio por representações de romance tradicional também é alimentado por dramas de época. Séries como "Bridgerton", "Os Bucaneiros", "A Idade Dourada" e "The Crown", juntamente com a antecipação de um novo filme de "Downton Abbey" e a série "Too Much" da Netflix, reacenderam o interesse por uma versão romantizada do cortejo histórico. Daniel Post Senning, especialista em etiqueta e autor de "Manners in a Digital World", destaca que essas narrativas "influenciam completamente" a forma como interpretamos nossas emoções e, consequentemente, as questões de etiqueta no namoro.
O fascínio americano por contos de fadas
Apesar de serem independentes da coroa britânica há quase 250 anos, os americanos sempre foram cativados pela realeza. Arianne Chernock, professora de história da Universidade de Boston, explica que a "febre Victoria" tomou conta dos EUA na coroação da Rainha Victoria em 1837. Mais tarde, animações como "Cinderela" da Disney e a coroação televisionada da Rainha Elizabeth II consolidaram ainda mais a popularidade das figuras reais.
Atualmente, o interesse americano na realeza se intensificou devido à presença de cidadãos americanos na família real, como Wallis Simpson em 1936 e Meghan Markle (agora Duquesa de Sussex) mais recentemente. A Princesa Diana, embora britânica, conquistou os EUA com seu trabalho humanitário, sendo considerada a "princesa do povo" do outro lado do Atlântico. Chernock argumenta que muitos americanos são fascinados pela monarquia justamente por ela ser uma fantasia, pairando acima das disputas políticas internas e oferecendo uma fusão de vida pública e privada não disponível para celebridades americanas.
Empoderamento ou regressão?
O "tratamento de princesa" é, em certo sentido, um nome equivocado. Em vez de retratar o estilo de vida de uma princesa, ele parece ser a interpretação das redes sociais do cavalheirismo. Historicamente, o cavalheirismo, derivado de um código de conduta medieval, evoluiu para descrever comportamentos tradicionais de homens em relação às mulheres. Alguns acadêmicos veem isso como um reforço de papéis de gênero tradicionais e uma manifestação de "patriarcado benevolente".
Por outro lado, Meier defende que atos simples como puxar uma cadeira demonstram cuidado e podem adicionar uma "camada de magia" aos relacionamentos, desacelerando as interações e permitindo apreciação.
A discussão sobre o "tratamento de princesa" não é nova, de acordo com Chernock, que aponta que a sociedade tem usado o tema da princesa para explorar ideias de feminilidade e propriedade há muito tempo. Esse debate é mais uma manifestação dos discursos de relacionamento fortemente marcados por gênero, seguindo a onda das "trad wives" (esposas tradicionais), que promovem papéis de gênero clássicos e um estilo de vida doméstico.
O apelo nostálgico do "tratamento de princesa" levanta a questão do poder: por que se contentar com uma tiara quando se pode exigir o "tratamento de rainha"? Para as adeptas do estilo de vida das "trad wives", a atração pode residir na passividade implícita do papel de princesa, já que o título de rainha tem conotações mais "carregadas e políticas", enquanto a princesa é retratada através da lente romantizada da juventude e da fantasia da Disney.
Contudo, Chernock ressalta que, em um certo nível, o apelo das princesas emerge de sua própria força. Quando meninas brincam de princesas, elas estão, de certa forma, "buscando permissão para comandar". E, se são as mulheres que estão postando sobre o "tratamento de princesa", talvez sejam elas, de fato, quem está no comando.
Fonte: www.bbc.com